terça-feira, maio 18, 2010

Ilha das Quirimbas - Ibo

O titulo desta viagem podia ser simplesmente: Ilha das Quirimbas - Ibo
ou então A aventura fim de dia de 2 Sandokans...
Entrámos para o pequeno barco/jangada de pesca.
Seguimos na frente do barco sentados em cima de redes de pesca, Mahomed no leme e os dois pescadores um pouco mais à frente, lado a lado para contra balançar o peso...
1ª tentativa para seguir à vela não correu bem. A vela feita de plásticos colados e cosidos uns aos outros não tinha vida, apesar do vento...
Com a desculpa que o vento não era ainda suficiente devido à proximidade da costa, saltámos para a água e empurrámos o barco até atingirmos uma profundidade de 1 metro de altura.
Aos poucos, já estávamos bem afastados da ilha.
Os pescadores remaram mais um pouco e nova tentativa de içar e seguir à vela...
A falta de jeito para o oficio de velejar era quase pornográfico.
Foi nesta altura que Mahomed recuperou o seu nervosismo, tentou também ele aproveitar o vento mas sem sucesso...
Percebemos que Mahomed se insurgia perante a incompetência dos pescadores.
Falavam numa língua nativa.
Os pescadores (provavelmente apenas ajudantes de pescadores...) não eram de Moçambique mas sim naturais do Zimbabue, terra sem mar...
O tempo ía passando, o fim de dia caía e nos lá íamos andando a remos, só a remos, ao sabor da força de braços dos dois ajudantes de pescadores.
No inicio relativizámos a coisa, relaxámos um pouco, aproveitámos a paisagem e a visita de uma tartaruga que mergulhou bem à frente da amostra de barco em que seguíamos a remos, só a remos...
Mas, novamente, o tempo ía passando, o fim de tarde caía, e ainda nem sequer tínhamos entrado no canal de matagal e mato que tínhamos percorrido a pé nessa manhã...
Começamos a perceber que se queríamos chegar a horas decentes a Ibo, ou simplesmente chegar, tínhamos que dar também ao cabedal e remar.
Cerca de 1hora mais tarde entrámos finalmente no canal, ladeados da tal vegetal densa...
Nunca estive no Pantanal Brasileiro, mas a paisagem não deve andar longe.
Ficámos animados...Uma parte da viagem estava percorrida.
O animo durou uns 10 segundos até à 1ª picada de mosquito, seguida de uma 2ª picada quase em estéreo.
O simpático canal da manhã tinha-se transformado num ecossistema perfeito para os mosquitos que aos nossos olhos, se riam dos comprimidos semanais da profilaxia da malária e do pequeno repelente que trazia na mochila...
Tirando Mahomed que seguia ao leme totalmente resignado, todos seguíamos a remar forte enquanto os Zimbabuenses cantavam à procura de mais energia, suponho...



A noite caía, pois claro...
Já tínhamos passado o limiar da dor de braços, já não os sentiamos e seguiamos em piloto automático relativizando tudo o que poderia estar relacionado com a dor.
Ao longe, no continente, uma paisagem maravilhosa.
No horizonte uma enorme tempestade com relâmpagos de uma dimensão que nunca tinha vista ameaçava a parte final da viagem.
É esta a força de Africa!
Tudo nesta natureza tem outra força e dimensão...
Mahomed dizia que faltava cerca de 30minutos. Nós sabiamos que a resposta queria dizer que só daqui a 1hora estariamos em Ibo.
Cerca de 1h30 depois, noite cerrada, guiados por pequenas luzes em terra, chegávamos finalmente a Ibo.
Helder (o dono do hostel) esperávamos com uma lanterna no pequeno cais da ilha, preocupado e a disparar perguntas sobre o porquê da demora...
Saimos e pagámos um pouco menos do que o combinado, porque sentimos que o sucesso da viagem dependeu também do calo das nossas mãos e não, conforme acordado, da força do vento...
Aí a coisa aqueceu um pouco com os pseudo pescadores, ajudantes de pescadores melhor dito...
Helder e Mahomed acharam justo a nossa leitura, fria apesar da fadiga e lideraram a discussão.
Seguimos para o hostel, enquanto o Helder resolveu o braço de ferro com um refrigerante para cada um dos ajudantes.
A hora já era avançada mas por sorte ainda conseguimos uma sopa de caranguejo divinal e um caril de camarão estupendo com um croquete de frango, manga e batata doce...
Literalmente soube pela vida!!

Como não podia deixar de ser, mandámos abaixo algumas laurentinas Premiun (a melhor cerveja local) bem frescas para repor o nível de descontracção e bem estar para o resto da noite;)
Partiríamos no outro dia, noutro barco (este a motor), para outras paragens e para uma viagem de 4horas de mar, mergulhos e paisagens cristalinas...
Era tempo de descansar, ao som da chuva forte e quente que nos entretantos atingiu a ilha...

sexta-feira, maio 07, 2010

ilha das Quirimbas

Cansados da caminhada e com bastante fome... Mas a vontade de explorar o "tal canal" onde os miúdos locais mergulhavam à procura de lagostas, camarões e polvos era mais forte naquele momento...
A visibilidade não era perfeita mas já tinha alguma profundidade e vida animal para saciar a nossa imensa vontade de conhecer os segredos do oceano Indico.

Assim que nos viram a rapaziada que pescava aproximou-se, ainda de forma tímida...

Em África (ou pelo menos neste "tipo" de África...) a máquina fotográfica tem um poder transcendental mágico.
A máquina foi o desbloqueador de conversa para falarmos sobre tudo.
Como é lógico e mais que justo (seria quase uma falta de respeito nossa não fazer parte daquele momento mais deles que nosso...) todos quiseram tirar várias fotos. De grupo, individuais, com e sem mascara de mergulho, etc...
.
Quiseram ver as fotos no imediato segundo, saber onde já tinhamos estado e ver todas as fotos da viagem....
Riam-se, riam-se...Riam-se muito. Riam-se com uma inocência desarmante.
Mostrei-lhes as fotos dos meus pais, do meu irmão e do meu cão.
Deliraram com todos os pormenores que as fotos deixavam ver de uma realidade muito diferente.

Mahomed também gostou de momento e delirava (embora de forma mais contida) com as fotos familiares...Mas cumpriu o seu papel de "chefe" da expedição. Lembrou que o almoço já deveria estar pronto. Tinhamos que ir...

As opções eram muito pouco. Ou peixe assado com arroz ou caril de peixe com arroz....Na casa do pescador atacámos o caril como se não houvesse amanha.
Convidámos Mahomed para partilhar o almoço connosco.

Era difícil perceber como aguentaria tantas horas sem comer, mas era precisamente isso que iria acontecer numa situação "normal"...

Com outra força e disposição, demos uma volta pela ilha... A paisagem era semelhante aquela que já tinhamos visto noutros pontos de Moçambique.

Casas com paredes de cana, pedras, cal queimada e terra e telhados de colmo ou folhas de palmeira, ruas de areia e muita criança a brincar... Ao contrário da Ilha de Ibo, sem ser a igreja deixada pelos portugueses e a escola, não existiam casas ou edificações em tijolo (com na maior parte do País).


Os habitantes vivem essencialmente daquilo que pescam. O que não é consumido na altura é seco para mais tarde... Vimos várias estruturas de madeira para secagem do peixe e do polvo.

O fim da tarde aproximava-se com a mesma velocidade com que o sol nascera. Era tempo de preparar a viagem de regresso a Ibo.

Fomos até ao largo junto à costa onde os pescadores se juntavam para negociar um barco que nos levasse de regresso. A maré já estava bem cheia e o caminho impossível de ser feito a pé.

Coincidimos com a chegada dos barcos tradicionais de pesca e com a descarga e distribuição do peixe pelas famílias dos pescadores.

Mahomed estava a ficar nervoso com o escurecer do dia e com a dificuldade em conseguir, por bom preço e fiabilidade, um barquinho para Ibo.

A maioria dos pescadores olhavam para nós sem grande entusiasmo, olhos vermelhos e baços de um dia de mar e da erva que fumavam para aguentar o dia...

É normal passarem um dia inteiro no mar em que o único alimento é uma bebida tradicional feita de aguardente, leite de coco e água.

Conseguimos finalmente um barco de pesca com dois pescadores e uma vela feita de um retalho de vários plásticos.

Mahomed tinha razão em estar nervoso... Mas seguimos!